O desconhecido já é um desafio por si só. O território ainda não desbravado, rostos não familiares, diferentes coordenadas para diferentes assuntos.
Por mais que a pessoa seja ‘uma fera’ na área em que vai atuar, sempre leva um tempo para se adaptar – mesmo que tenha anos de repertório em diferentes empresas.
Será um onboarding presencial ou remoto? Haverá tempo para um almoço de boas-vindas, para apresentá-lo(a) à equipe – sem que seja diretamente no treinamento, onde geralmente não há espaço para conversar sobre amenidades, experiências, coisas da vida fora do roteiro corporativo? Tempo para um café, um tour descontraído pelos ambientes, apresentando-o(a) a outras pessoas de outros departamentos – não precisamos nos relacionar somente com quem trabalhamos. Um tempo para contar a história da companhia ou projeto – e para se trocar impressões – para que o entendimento e a relevância do trabalho a ser desenvolvido ali, individual e coletivamente, vá além das horas contabilizadas em uma planilha e do retorno financeiro.
No caso de um onboarding remoto, o que pode ser feito para aproximar quem está atrás da tela e diminuir a sensação de distância, de impessoalidade – já que nesse caso não se conta com o cenário da empresa e toda a movimentação de pessoas ‘ao vivo e em cores’?
Para além de kits de boas-vindas, aplicativos e plataformas, treinamentos e projeções de expectativas, quanto é investido na adaptação e no bem-estar do(a) colaborador(a) que acaba de chegar? Haverá tempo (e vontade?) para bate-papos de integração, por exemplo com uma happy-hour online, sem falar de trabalho – ou isso seria considerado ‘supérfluo’?
E conversas periódicas de feedbacks, estão no radar das lideranças e gestore(a)s? Quem acaba de chegar, tem voz? Quem está começando, tem vez? Se alguém sentiu um desconforto, antipatia, mal-estar de algum dos lados, há espaço para se expressar? Se o desconforto é em relação a uma liderança ou figura ‘muito querida por todo(a)s’, há acolhimento (e discrição) para quem compartilha esse sentimento? Como essas questões humano-sociais-emocionais são conduzidas?
A chegada de uma nova pessoa pode ser bálsamo ou catarse. Mas isso não é um decreto, é uma escolha. E uma escolha que só depende de nós.
Como enfatizamos no último texto, qualquer empresa, por maior e conhecida que seja, é feita de por pessoas. Pessoas são complexas por natureza, cada qual com seus universos de herança genética, história pessoal e familiar, experiências, memórias, vitórias e aprendizados. Cada qual com sua personalidade, mais ou menos sintonizada com a sua.
Cada qual com seu jeito de fazer as coisas, mais ou menos alinhado com o seu. Não há melhor ou pior, certo ou errado – ainda que existam as regras (explícitas ou implícitas) e/ou combinados na empresa –, trata-se de observar como as peças se encaixam, quem funciona melhor ao lado de quem, que habilidade um(a) tem que complementa a do(a) outro(a). Somos maestros de uma orquestra de múltiplos talentos que aparenta ser fixa, mas não é eterna e, sim, uma ciranda em constante movimento que, além de todas as características que falamos acima, é suscetível aos ciclos que cada pessoa vivencia ao longo de sua existência única e intransferível. A antroposofia fala em setênios – mudanças sutis e internas que acontecem a cada período de 7 anos –, outras ciências complementam com outras leituras do impacto do tempo sobre nossas vidas e corpos humanos (aqui englobando aspectos físico, mental e emocional). O que podemos fazer é observar como nossas fantásticas orquestras funcionam, se estão em harmonia, se alguém está querendo solar sem a base do coletivo, se o grupo está permitindo que a pessoa nova que chegou ocupe com propriedade e liberdade o seu lugar, se todos os talentos estão sendo reconhecidos, potencializados e bem gerenciados – individual e coletivamente.
E não basta o onboarding ser humanizado. Todas as práticas dentro da organização precisam ser também. Até mesmo naqueles lugares “em que ninguém está olhando” – é nesses momentos que se vê a verdade de cada pessoa física e jurídica. Sem marketing, redes sociais, relações públicas. Não adianta fazer uma bela encenação de boas-vindas, treinamento e adaptação com todo time perfumado e sorridente e, no decorrer dos meses, as máscaras irem caindo e os heróis dando lugar aos vilões. Gentileza, paciência, respeito e honestidade podem e devem ser cultivados e praticados em todas as esferas, independentemente de cargos/posições, em todas as organizações. Um bom caráter não é exclusivo de seres humanos – pode fazer parte de seres corporativos também.
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